Lembro-me de quando era pequeno, dizer aos meus pais: “Eu não quero crescer e ser adulto.” Minha mãe que ouviu o que eu disse, deu risada e me perguntou o porquê eu tinha optado por essa escolha. Eu, muito sabio que era (aos meus 5 anos mais ou menos) respondi “Não quero ser adulto porque terei que deixar de brincar.”
Essa talvez pareça uma piada infantil, porém era um desejo genuíno, de um humano em miniatura, em ser o que devia ser naquele momento... Ser uma Criança! Muitas vezes nos deparamos com o comportamento infantil de um pequeno e nos questionamos “de onde esse menino/menina aprendeu isso?”. Diria até que, em algumas dessas situações, há uma censura contra o comportamento inocente e simples dessa criança.
Eu quero propor um momento de reflexão entre vocês que são pais, mães, responsáveis ou simplesmente leitores... Quero propor um exercício de Imaginação (quanto tempo será que não brinca com esse mundo alternativo à realidade cinza e caótica da atualidade, ahn?!). Fique tranquilo, minha proposta não é nada de cunho espiritual, muito menos direcionar uma hipnose ou transe. Quero apenas que leia atentamente e se permita vivenciar o exercício que vou trazer a frente.
Antes, preciso pedir que respire fundo por 5 vezes seguidas... Inspirando e Expirando devagar, lentamente, como quem vê a tranquilidade da natureza entrar e a agitação do mundo sair...
Pronto, vamos nos exercitar um pouco...
Me convidem para brincar, por favor
Você agora está em seus primeiros 3 anos de vida. É bem pequeno, tudo ao seu redor é muito grande. A cadeira da sala de jantar é alta para subir sem ajuda e o próprio sofá você precisa de muito esforço para conseguir subir. Já anda, ensaia uma corrida... Porém ainda não consegue pular muito bem. Você está em sua casa natal, a primeira casa que já morou em sua vida. Seus pais estão em casa e você esperou o dia inteiro para poder brincar com eles. Dá para ver que está escuro lá fora, já que não tem tantas luzes assim. Você está vestido com sua “roupa de ficar em casa”, bem quentinha e confortável.
Dentro de você há algo muito bom... Um... Um... Parece que tem uma “bola pingando muito forte” dentro de seu peito, e é inevitável não sorrir quando eles, seus pais, olham em direção a você. Porém... Eles parecem não sorrir junto, não dá para entender como eles conseguem sentir essa “bola pingando forte” no peito e ainda não sorrirem... Como é possível alguém não sentir o que você está sentindo?
Você se aproxima do seu pai. Ele está bem ali, a uns 10 passos seus, sentado no sofá. Você corre, bate seu corpo em sua perna, e ele o olha... Seus olhos cruzam o dele, você abre um sorriso, coloca seus braços para cima e... Ele sorri com o canto da boca, e logo em seguida fala algo para sua mãe. Parece que ele disse algo como “Amor, eu acho que o bebê quer dormir, consegue pegar ele aqui... Estou muito cansado.” Você continua com os braços estendidos, olha em direção a ele e seu sorriso diminui. Você diz então, na esperança de conseguir um sorriso dele “Pai, vamo brinca?”.
Seu pai então diz “Pai não vai brincar hoje bebê... Papai está muito cansado. Amor, pega o bebê aqui, ele disse que quer brincar, acho que é sono...”. Sua mãe responde seu pai “brinca com ele um pouco ué... também trabalhei hoje e estou cansada. Acho que ele não está com sono ainda” Seu pai diz então “Amor, faz ele dormir aqui, EU NÃO QUERO BRINCAR COM ELE, estou muito cansado.” A sua mãe responde então “ele pediu para você, é você que ele quer.” E seu pai diz mais uma vez “Hoje eu não vou brincar com ele. E estou indo deitar no quarto!” Você olha e aquele gigante está agora em pé e com uma cara feia. Ele olha com aquela cara feia e fala para você “vai lá pedir para sua mãe fazer você dormir.”
E você pensa “eu só queria brincar com ele e agora ele está bravo comigo.” E você sente aquela “bola pingando” murchar... Não dá para saber o que está acontecendo dentro do peito... parece que a bola foi furada e isso dói... E essa dor lá dentro é forte, então começa a chorar... A mãe entra em cena e pega você no colo.
Você pensa então “como faz para parar de doer isso? Será que a mamãe vai me dar um daqueles remédios e isso vai para de doer?” a mãe balança e balança você no colo dela, bem próximo. O pai passa por ela e vai para outro cômodo da casa. Você o vê olhando feio ainda e pensa “eu só queria brincar.”
Então aquela bola parece que fica normal de novo. Não dói mais nada. Mas você percebe que alguma coisa está acontecendo. A sua mãe o coloca no chão e vira de costas. Agora é a hora de brincar com a mãe, já que ela estava ali com você. Então vai correndo atrás da mãe. Quando a mãe para, um tanto próximo de você a sua frente, você continua correndo e pensa “vou parar nela para ela brincar comigo.”
Quando encontra a parte de trás da mãe, a mãe grita “AAAAAAAÍ!”. Logo que isso acontece a mãe vira para você, se abaixa e fica com cara feia também. A mãe fala “Por que você bateu na mãe? Não pode bater na mãe!” e da uma palmada na sua mão. A palmada não doeu, mas a bola voltou a murchar dentro de você e você pensa:
“Eu só queria brincar...”
A reflexão...
Agora pode voltar. Vamos pensar um pouco nessa história.
Se você se emocionou, imagina com sua criança fica quando o(a) vê. As crianças não têm o mesmo senso de justiça, mentalidade, capacidade de abstração, ou quais quer outra forma de abstrair o mundo que não seja de forma concreta e sensorial. Nesse exemplo, essa criança sentiu a emoção da “Tristeza” por perder a atenção e o apreço do pai no primeiro momento e depois perder a atenção da mãe. E não sabia lidar nem nomear essa emoção... Isso tudo porque ela só queria brincar...
Portanto, uma das reflexões mais importantes que eu gostaria de trazer com essa ficção é: seu filho as vezes não está com fome, frio, ou sono, está somente com vontade de ter você por perto!